Conversa entre 2 crianças…!!!
- E aí, meu?
– Tudo fixe, boy?
– Ah, mais ou menos. Ando meio chateado com algumas coisas.
– É a minha mãe. Sei lá, ela anda a falar umas coisas
estranhas, aterrorizando-me, sabes?
– Como assim?
– Por exemplo: há alguns dias, antes de dormir, ela veio com
uma conversa maluca. Mandou-me dormir logo senão uma tal de Cuca viria
apanhar-me. Mas eu nem sei quem é essa Cuca, pá. O que é que eu fiz pra essa menina
querer apanhar-me? Tú conheces-me desde que eu nasci, já alguma vez me meti com
alguém?
– Nunca.
– Pois é. Mas o pior veio depois. A conversa maluca
continuou. Minha mãe disse que quando a tal da Cuca viesse, eu ia estar
sozinho, porque o meu pai tinha ido pra fazenda e a minha mãe passear. Mas
tipo, o que meu pai foi fazer na fazenda? E mais: como minha mãe foi passear se
eu estava a vendo ali na minha frente? Será que eu sou adotado, meu?
– Sabes a tua vizinha ali da casa amarela? A minha mãe diz que ela tem uma hortinha no
fundo do quintal. Planta vários legumes. Será que a tua mãe não quis dizer que o
teu pai deu um pulo por lá?
– Hmmmm. pode ser. Mas o que será que ele foi fazer lá? FOGO!
Será que o meu pai tem um caso com a vizinha?
– Como assim, boy?
– Meu, ela deixou bem claro que a minha mãe tinha ido
passear. Então ela não é a minha mãe. Se o meu pai foi na casa da vizinha, vai
ver eles dois estão tendo um caso. Ele passou lá, apanhou-a e foram os dois passear.
É isso, meu. Eu sou filho da vizinha. Só pode!
– Calma, maninho. Estás nervoso e não podes tirar conclusões
precipitadas.
– Sei lá. Por um lado pode até ser melhor assim, sabes?
Fiquei sabendo de umas coisas estranhas sobre a minha mãe.
– Tipo o quê?
– Ela me contou um dia desses que pegou um pau e atirou em
um gato. Assim, do nada. pura maldade, meu! Vê lá se isso é coisa que se faça
com o bichano!
– Caramba! Mas por que ela fez isso?
– Pra matar o gato. Pura maldade mesmo. Mas parece que o
gato não morreu.
– Ainda bem. Boy, a sua mãe é perturbada.
– E sabes, a Francisca ali da esquina?
– A Dona Chica? Sei sim.
– Parece que ela estava com ela na altura e não fez nada. Só
ficou lá, parada, admirada vendo o gato
berrar de dores.
– Foge, estes adultos às vezes fazem com cada coisa que não
dá pra entender.
– Pois é. Vais ver é até melhor ela não ser a minha mãe, né?
Ela me contou isso na boa, cantando, sabes? Como se estivesse feliz por ter
feito essa selvageria. Um absurdo. E eu percebo também que ela não gosta muito
de mim. Um dia destes, ela ficou tentando me assustar, fazendo um monte de
caretas. Eu não achei graça, né. Aí ela começou a falar que ia chamar um boi
com cara preta pra me levar embora.
– Nossa, boy. Com certeza ela não é a tua mãe. Nunca uma mãe
ia fazer isso com o próprio filho.
– Mas é ruim saber que o casamento deles está mal, né? Que o
meu pai sai com a vizinha e tal. Apesar que eu acho que ele também leva uns
chifres, sabes? Um dia contou-me que lá no bosque do final da rua mora um cara,
que eu imagino que deva ser muito bonitão, porque ela chama ele de ‘Anjo’. E
ela disse que o tal do Anjo roubou o coração dela. Ela até falou um dia que se
fosse a dona da rua, mandava colocar ladrilho em tudo, só pra ele pode passar
desfilando e tal.
– Nossa, que casamento horroroso esse. Era melhor separarem-se
logo.
– É. Eu só sei que tô cansado destas conversas doidas dela,
sabes? Às vezes ela fala algumas coisas sem sentido nenhum. Ontem mesmo veio falar
que a vizinha “cria perereca em gaiola”, meu. Vê se pode? Só tem loucos nesta
rua.
– Tchiii, boy. Mas a vizinha não é a tua mãe?
– FOGO, é mesmo! Estou ferrado de qualquer jeito.